Marie-José Mondzain
Sideração
Tradução de Laura Erber
TRECHO DO LIVRO
“Em um mundo onde a esfera da surpresa é escrava de uma dupla tirania, a da novidade a todo custo e aquela do escândalo financeiro – sexual sobretudo – e de todo tipo de comércio do choque de palavras e fotos, como temos escutado, poderíamos pensar e entender a ‘sideração’ apenas sob o regime prévio da impaciência, da energia marcial, criminal ou balística, em que a sede de novidades e surpresas é de tal modo erotizada que poderíamos concluir que, sem a sideração, irmã da surpresa e do inesperado, há somente decepção, tédio e sono do corpo e do pensamento. Seria necessário aceitar que a técnica do zapping se tornou também zapping mental, e que a renovação contínua dos objetos não dá a menor chance ao ritmo da atenção e da palavra. De certo modo, é como naquela passagem em que Pascal constata que ‘o mundo era tão louco que não ser louco seria sofrer de um outro tipo de loucura’. Assim também poderíamos dizer de nossa sideração diante da paisagem acelerada de todas as siderações organizadas e programadas por nosso meio. Não me contentarei com isso.
Os estados de sideração organizados pela indústria do espetáculo costumam acompanhar o espetáculo anunciado e teatralizado do apocalipse. Revelação pânica de um desastre aguardado… Em outros termos, o fim está próximo, não se surpreendam! No contexto retórico da crise e de seu léxico depressivo, há um chamado ininterrupto para o sobressalto. Pergunto-me simplesmente, então, o que é feito da arte do salto, aquele que é preciso realizar quando nos arriscamos, quando resistimos à repetição ou nos colocamos em perigo para transformar um estado da matéria ou um estado do mundo. Quando para nós tudo se reduziu a querermos ou devermos nos sobressaltar, é mais um espaço de terror que se instala onde queremos ver tudo explodir, já que não podemos explodir.“